Independência ou profissionalismo? Responde-me, Aristóteles
*Por Kallil Dib
Não saberia responder se acaso alguém, qualquer indivíduo, me perguntasse: "o que você faz da vida?". Não é que não faço nada, fico encostado, lendo livros de receitas e assistindo sessão da tarde. Sou até muito ocupado, eu diria.
Além da faculdade, que estou terminando, tenho outros compromissos e metas na minha vida. Tenho alguns artigos para escrever, um site para abastecer, e horário para cumprir em uma empresa, na qual sou contratado. Além de perder um tempo dormindo, sonhando...
Me considero, como poucos brasileiros, um profissional da área em que atuo. E olha que de profissionais a escassez por aqui é grande. Não falo isso da boca pra fora não. A taxa de desemprego no Brasil ficou em 4,7% em dezembro, segundo o IBGE. Eu sei que já foi maior, mas os números ainda são abusivos.
Assim, comprovamos que vivemos hoje num mundo de trabalhadores autônomos, sem registro, sem carteira de trabalho, e sem sequer o profissionalismo, algo que seria exigido em uma empresa séria, ou no decorrer de um curso superior.
Antes que comecem as condenações prévias, não estou aqui criticando os 'profissionais independentes', mas por serem independentes, devem ser ainda melhores. Devem cumprir horários, exigências, compromissos, e devem se destacar com algo diferenciado, para assim constituírem uma carreira sólida e bem sucedida, competindo e ganhando daqueles formados e registrados. Mas, sem generalizar, os autônomos estão cada vez mais autônomos, e o sucesso obtido acaba 'subindo pra cabeça'.
Baseado em fatos eu discorro esse artigo.
No interior essa realidade de independência profissional é vista de perto. Quantos não são os salões de beleza, comércios de roupas, ou estúdios de tatuagem, espalhados por aqui. Muitos, porém, salvamos poucos.
No último mês um caso me fez repensar sobre a ideia de independência profissional. Era um desses trabalhadores que se destacam na cidade por sua arte original, e maneira própria de exercer o seu trabalho. Mas, às vezes não é necessário apenas ser bom. Alias ser profissional e ter profissionalismo, são coisas diferentes.
E a garota, ansiosa, sorridente, e decidida foi até onde ansiava para fazer a sua primeira tatuagem. Horário marcado há tantos dias, a dor antecipada e a aflição a faziam repensar, mas a vontade era maior, e no horário marcado estava lá. Mas foi em vão toda a angústia e tempo dedicado ao 'sofrimento' prematuro.
O profissional não a atendeu, nem quis conversar. Mandou um recado através de seu ajudante. Dizia ele que estava com dores nos pulsos, por isso era impossível atende-la. Horas, mas que dores são essas que o impediu até de ligar, ou de ao menos conversar com sua 'cliente'? Não sei se são dores, nem sei se são flores, ou então engano, mas se de sucesso se faz a vida, alguém o colocou lá. E pra que atender quem não quer, se o status alcançado já permite escolher seus clientes?
A garota foi embora cabisbaixa, revoltada e sem aspectos de um sorriso, que certamente o tatuador proporcionaria.
E como esse, outros casos de estrelismo e não profissionalismo se evidenciam por aí. Às vezes em determinados ambientes o acaso se transforma no irreal. E ser bom no que se propõe a fazer, requer mais do que algumas técnicas caseiras ou diplomadas. Quem faz o sucesso de qualquer profissional, é o seu público, seus clientes. Principalmente desses autônomos.
"O prazer no trabalho aperfeiçoa a obra.", disse Aristóteles. Tanto para os independentes quanto para os registrados. E que essa prosa impere, e que o tatuador volte às suas origens. Apenas assim o profissionalismo se vincula ao profissional, autônomo ou não.
Kallil Dib
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